sábado, 3 de abril de 2010

CONHEÇA DUAS FAMÍLIAS QUE NEM O AMOR SALVA DO CRACK

Conheça duas famílias que nem o amor salva do crack


Histórias de dedicação nem sempre são suficientes para proteger os filhos

Eduardo Rodrigues eduardo.rodrigues@diariogaucho.com.br

Histórias de dedicação como as deste pai e desta mãe nem sempre são suficientes para proteger os filhos do contato com a pedra da morte. Como não vem sendo no caso deles.

São relatos pungentes de famílias derrotadas pelo vício que aprisiona adolescentes e mantém os pais reféns de uma situação sobre a qual não têm controle. Ambos sonham com a recuperação dos jovens, mas a realidade mata, um pouco a cada dia, a esperança nos corações e o brilho no olhar.

O drama de uma mãe

De tanto sofrer e apanhar, ela chora, mas não verte uma lágrima. O corpo é magro, as roupas, simples.

Ao lado do filho de sete anos, a mulher de 34 despeja um rosário de lamentações. O guri maior, de 14 anos, é viciado e está na 11ª internação. Abraçou o crack há um ano e meio. Neste período, a vida da família foi varrida por um tsunami (onda gigante). Roubo, violência, ameaças.

– Qualquer dia ele aparece morto – soluça a mãe.

Da casa, já levou quase tudo: roupas, cortinas, celulares, DVD, tintas e, pasmem, até o motor da geladeira. Trocou tudo por pedras.

– Quando surta, fica agressivo. Já me bateu várias vezes. Agora, comecei a reagir – confessa a mãe.

Separada, ela voltou a trabalhar, mas nunca fica descansada. Quando retorna, à noite, sente falta de objetos, móveis e utensílios domésticos. Está desesperada, não sabe mais a quem recorrer.

– Já tentei de tudo, gastei o que tinha, mas a Justiça não ajuda. Vinte dias numa clínica é pouco. Ele não quer mais saber da família, não tem mais amor, autoestima. Vão esperar ele morrer para fazerem alguma coisa? – reflete.

O pesadelo de um pai

Ele perdeu o antebraço esquerdo quando trabalhava na colheita de uva em Caxias do Sul, na Serra. Tinha 13 anos. Hoje, com 39, tenta se reerguer de um novo tombo: o vício incontrolável do filho de 13 anos e a rebeldia das filhas de 14 e 15 anos.

Na segunda-feira, os três desapareceram de casa, sem vestígios. O homem não sabe o motivo do sumiço das meninas, que não usam drogas. Em casa, só ficou o filho menor, de 11 anos.

A tragédia familiar começou antes de se estabelecerem na Capital. Morou em várias cidades, namorou, casou, vieram os filhos e os problemas. Separou-se. A mulher foi com as crianças para o Interior.

Um dia, recebeu uma ligação do Conselho Tutelar para buscar os filhos, deixados num abrigo. Feliz da vida, decidiu criá-los sozinho. Mas, com o passar do tempo, sua vida virou um inferno.

– Ele fala para todo mundo que vai me matar. Uma vez, botou um comprimido no feijão, mas o pequeno viu e não comemos. Já quebrou todas as janelas da frente de casa, roubou celular, sabonete, pasta de dente e meus documentos. Estou ficando louco – lamentou o pai.

- "Ele sai da clínica e não tem pra onde ir”

Experiente conselheiro tutelar da Microrregião 5 da Capital, Paulo Alves não desiste. Sabe que a guerra é longa. Prefere vencer batalhas. Luta de etapa em etapa para recuperar filhos viciados, mas não consegue superar alguns degraus devido à burocracia e à falta de investimento do poder público.

Nesta rápida entrevista, ele explica por quê.

Diário Gaúcho – Como funciona o tratamento para estes casos?

Paulo Alves – Na Capital, é via Pam 3. A gente leva o viciado ao médico, que analisa e autoriza internação para compra das vagas. Temos duas clínicas, mas o jovem fica no máximo 20 dias longe das drogas, com apoio psicológico, alimentação e tudo o que for necessário.

Diário Gaúcho – O tempo é ideal?

Paulo – Não, estão rasgando dinheiro do contribuinte. Cada internação custa cerca de R$ 20 mil. Deveria ficar 90, 120 dias e depois continuar em programas de atendimento, ter uma sequência assistida. Existem as fazendas terapêuticas, mas nem todos vão ou têm dinheiro. Quando sai da clínica, ele volta para a família desestruturada e acaba na rua novamente, fazendo as mesmas coisas. Uma vez, um adolescente deu alta de manhã e, à tarde, nós estávamos na frente do médico, pedindo nova internação.

Diário Gaúcho – Você identificou quais tipos de família?

Paulo – A negligente, a estruturada e a ausente. A primeira é aquela cujos pais não estão nem aí, não têm iniciativa para enfrentar a nova realidade. Na segunda, eles trabalham, os filhos estão na escola, fazem cursos. A última família é aquela em que os pais não verificam se o filho está mesmo na sala de aula, quem são seu amigos e por onde eles andam.

FONTE: DIÁRIO GAÚCHO

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